quinta-feira, 20 de março de 2008

Servidores Temporários do Amazonas: Competência da Justiça Comum Estadual

Faz oito anos que a emenda 45 foi publicada e ainda existe divergência nos Tribunais a respeito de sua aplicação, em especial em relação à competência para julgar as relações de trabalho.

A emenda constitucional n.45/04 ampliou consideravelmente a competência material da Justiça do Trabalho, permitindo que esta julgue: a) ações oriundas das relações de trabalho; b) ações sobre disputas de representatividade entre sindicatos, sindicatos e trabalhadores e sindicato e empregadores; c) penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização da justiça do trabalho; e d) o conflito de competência entre os seus tribunais, ressalvado quando entre tribunais superiores. As demais alterações apenas confirmar o que a jurisprudência já havia aplicando, como no caso da competência para julgar as ações de indenização de dano moral ou patrimonial decorrentes da relação de trabalho.

A criação do princípio da competência específica traduz-se na atribuição da justiça do trabalho para decidir acerca da "relação de trabalho", termo mais abrangente do que "relação de emprego". Esta limita-se às causas envolvendo empregador e empregado, enquanto aquela envolve a relação de emprego e todas as demais causas que influenciam na esfera jurídica do trabalhador.

A Administração pode contratar sob o regime da legislação trabalhista ou sob o regime da legislação estatutária, diferenciando o ocupante de emprego público do ocupante de cargo público. Pietro doutrina que "o ocupante de emprego público tem um vínculo contratual, sob a regência da CLT, enquanto o ocupante do cargo público tem um vínculo estatutário". Questiona-se estes vínculos estão englobados pela expressão "relação de trabalho" presente no art.114 da CF.

O STF tem entendimento no sentido de que, quando a contratação for feita no regime estatutário, a competência é da justiça comum ou federal conforme o nível federal ou estadual do órgão questionado, enquanto competirá à justiça do trabalho as causas celetistas, notadamente ADI 3395/DF:

EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária.


 

Este entendimento deve prevalecer inclusive quando a contratação for feita em regime temporário, doutrinando Nascimento:

A competência para julgar questões sobre contrato a tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público da Administração é da Justiça Comum, quando, evidentemente, tratar-se de estatutário.

A Justiça do Trabalho de Manaus analisou a contração de 7 mil funcionários da área da saúde pelo governo do Estado do Amazonas e decidiu pela rescisão gradual dos mesmos, a fim de atender à obrigatoriedade de contratação pela Administração, salvo cargo em comissão e empregos com esta natureza.

O governo do Amazonas, alegando desrespeito à jurisprudência do Supremo Tribunal e incompetência da Justiça do Trabalho para julgar o feito, propôs a Reclamação 5381, alegando que o contrato havia sido feito sob o crivo do estatuto dos servidores públicos do Estado, o que nos termos da ADI 3395/DF, a competência seria da Justiça Comum estadual.

A maioria dos Ministros entenderam, no dia 17 de março de 2008, que a relação entre o Estado do Amazonas e os seus servidores temporários é de direito administrativo. A Ministra Carmem Lúcia em seu voto, citando o caso de professores contratados para substituir colegas em regime de urgência, disse que "há casos em que, apesar de os servidores não serem estatutários, a relação de trabalho com o poder público instaura uma relação de direito administrativo cujas causas são de competência da Justiça comum", chamando o fenômeno de "geração espontânea de vagas".

A interpretação da Ministra é emblemática pois estabelece a competência da Justiça Comum ainda que os servidores não sejam estatutários, desde que haja uma "relação de direito administrativo". Note que o voto utilizou uma lógica diferente, ou seja, ao invés de verificar se estavam presentes as características da relação de trabalho, analisou-se a presença das características da relação administrativa.

O ministro Carlos Alberto Menezes Direito também votou no sentido de que nos casos de contratações emergenciais e temporárias pelo poder público, "a relação que se impõe é de direito administrativo, qualquer que seja a duração do contrato de trabalho".

Está claro que embora o tema não seja pacífico, o entendimento mais seguro é no sentido de que a distribuição de competência entre a Justiça Comum e Trabalhista deve ser auferida analisando-se a relação contratual estabelecida, ou seja, se estatutário, competirá à Justiça Comum, enquanto se for celetista, competirá à Justiça do Trabalho.

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